“Ai, mouraria...
Da velha Rua da Palma...
Onde um dia deixei presa a minha alma...”
Foi com esses versos que Ela me fez chorar feito
criança, quando fazia uma participação especial numa seresta lá no antigo
Mirante, numa sexta-feira de 10 ou 15 anos atrás. A voz baixa, rouca, delicada,
sempre no tom certo, sempre injetada de paixão em cada palavra cantada. Não
tive vergonha nenhuma de chorar, mesmo ali, na frente de centenas de pessoas.
Mesmo com toda a simplicidade, toda a falta de pretensão, mesmo que ela
estivesse só brincando de cantar, aquela foi uma das mais belas interpretações
que eu vi na minha vida. Feita por uma das pessoas que mais admiro nesse mundo.
Eu sempre gostei de provocar meu grande amigo Zeno
dizendo “eu quero mais bem à sua avó do que você”. Acredito que ele ficava meio
irritado, mas depois desencanava, porque acabava compreendendo que uma pessoa
como Dona Maria Celi não podia ser amada exclusivamente pelos seus familiares.
O mundo inteiro amava aquela pequena senhora, por tudo que ela havia
construído, conquistado e transformado em Catolé do Rocha.
Professora dedicada, foi um pedaço vivo do Colégio
Normal Francisca Mendes. Até hoje não acredito que Dona Maria Celi tenha se
formado em Pedagogia. Até onde eu sei, a Pedagogia que se formou em Dona Maria Celi.
Apaixonada pela sua segunda casa, não media esforços em angaria fundos para seu
tão amado Cordão Azul, que durante anos foi imbatível nos Pastoris, tudo graças
aos esforços da pequena gigante.
Mãe de quatro filhos que herdaram não só seus
genes, como seu caráter, sua honestidade e sua paixão pelas coisas mais simples
da vida. Zeninho, Celinha, Ronaldo e Eliane não poderiam crescer de outra forma
senão vitoriosos, uma vez que tinham em sua própria mãe um dos maiores exemplo
de disciplina e educação que nossa cidade já viu.
Estava distante de Catolé quando ela partiu.
Viajei para passar um fim de semana com a família na praia, sem televisão, sem internet, sem
sinal de celular, isolado da civilização. Só na noite do domingo é que encontraram
um meio de nos contatar. E fui acordado no meio da noite com a dolorosa notícia
de sua partida. Antes mesmo do dia amanhecer completamente, desci para a praia
e deixei meus pés serem molhados pelas ondas da maré que subia aos poucos...
Alí, olhando para o infinito feito de água,
lembrei de todos os agradáveis encontros que tive com Dona Maria Celi. Lembrei
de todos os Forrós da Amizade emq eu ela me chamava de lado só pra dizer,
sorrindo, que o forró tava horrível, as musicas estavam ruins e tudo tava muito
desorganizado. Sua filha Celinha certamente dará continuidade a esse esquete de elogios.
E por fim, lembrei de um encontro da Familia
Fixina, ao qual fui honradamente convidado a participar, e que fui totalmente
surpreendido quando Dona Maria Celi pegou o microfone e anunciou que cantaria
especialmente pra mim, a canção que me fizera chorar naquela seresta tantos
anos atrás...
E ali, com o mar como companhia, chorei. Em meio
às lágrimas, recitei mais que cantei os versos simples de “Ai Mouraria”. Cantei
com um aperto no peito, percebendo que nunca mais ouvirei essa canção cantada
pela sua voz rouca e cansada. E meu fim de semana se foi... E tudo que eu
queria agora era voltar pra casa.
Hoje chego em Catolé e, apesar de estar tudo do
mesmo jeito, sinto que algo está faltando. Só me resta aceitar que esse é o
nosso destino: dizer adeus a quem nós mais amamos. Prefiro acreditar que, depois
de 22 meses, Dona Maria Celi não agüentou de tanta saudade e correu pros braços
de Seu Zeno...
Fica em nós a saudade. A saudade de quem mesmo
pequenina, sempre foi grande. Alguém que colocou seu nome na história de Catolé
do Rocha. Alguém que despertou carinho e admiração de todos que cruzaram seu
caminho e conheceram a pessoa incrível que ela foi. Alguém que durante toda sua
vida semeou bondade, regou ternura e colheu amor.
“Amor que o vento, como um lamento, levou
consigo...
Mas que ainda agora, a toda hora, guardo comigo.”
Vá em Paz, professora...
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