Moleque De Novo...



Como diria Paul Edgecomb em À Espera de Um Milagre, "as vezes o passado te apanha de surpresa."


E apanha mesmo. Ontem por volta das 1:30 da manhã, eu estava na garagem daqui de casa, jogando conversa fora com um velho amigo pelo celular, e remexendo nas caixas empilhadas onde guardamos todo tipo de coisas inúteis daqui de casa.


Estavamos falando justamente sobre Toy Story e seus brinquedos quando em meio aos cacarecos, encontrei uma pequena caixa que chamou minha atenção. Era uma caixa pequena de estabilizador de energia, colocada entre duas caixas grandes. Nela, com a letra de mainha em lápis hidrocor, estava escrito: BONECOS DE KAKITO.


Como assim? Desde quando minha coleção de mais de 50 bonecos iam caber numa caixinha de estabilizador? Tinha algo errado alí. Até porque minha verdadeira caixa de bonecos, a grandona, é guardada em outro quarto, não na garagem.


Abri a caixinha, extremamente curioso, meu amigo, curioso, compartilhando comigo essa tensão do outro lado da linha. E o que encontrei lá dentro me fez abrir um sorriso enorme de alegria. 


Em meio a alguns cacarecos, uma cabeça de barbie (não, não é minha), e um óculos escuro de carnaval, estavam eles: Quatro pequenos bonecos do S.O.S Comandos. Quatro pequenas figuras de ação representando soldados de guerra. Quatro dos meus melhores amigos de infância.


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Esse é Jack. Um Coronel que perdeu sua esposa, assassinada pelo temível Capitão Caolho, estava sempre em busca de vingança. É o único dos quatro que tinha nome. Isso porque ele era o herói. E pra mim, desde sempre, o mocinho tem que se chamar Jack. Não me pergunte por que.







Esse é o Caolho. Dei esse título mega-criativo a ele provevelmente pelo fato dele ser caolho. E talvez por ser caolho, eu sempre o escolhia pra ser o mais fodão chefão do mal. Foi ele quem matou a esposa de Jack. E sempre era dele a luta mais longa. E a morte mais sangrenta. Fidirrrapariga.





Esse é o Mascarado. Nas minhas histórias de Jack, ele é o braço direito do Caolho. Mas por muitas vezes foi protagonista, quando eu resolvia fazer minhas proprias versões de Sexta-feira 13.



E esse é o Negão. As vezes era do bem, as vezes era do mal. Mas não importava, porque ele sempre morria logo.

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Com esses quatro bonecos dentro da caixa, eu tinha novamente uma missão em mãos. Continuei conversando com meu amigo, feliz da vida, porque eu sabia que aquela noite não estaria completa sem um reencontro. Sem um novo confronto. Sem uma última batalha. Pelos velhos tempos.


Assim que terminei de conversar com ele, corri pro meu quarto e me sentei no chão. Tirei os quatro gigantes da caixinha e os coloquei na minha frente. Peguei Jack com minha mão esquerda, Caolho com a direita. Coloquei os dois frente a frente mais uma vez, depois de mais de uma década.


Caolho: Finalmente nos encontramos novamente, caro Jack.

Jack: Eu esperei noite e dia por esse momento, caolho.

Caolho: Vamos lá, Jack, você ainda guarda todo esse ódio depois de tanto tempo?

Jack: Eu não guardei esse ódio, Caolho. Eu o alimentei. O alimente com a esperança de colocar minhas mãos em você pelo menos mais uma vez. E esta noite é a noite.

Caolho: Você acha que ainda tem fôlego suficiente pra começar tudo isso de novo?

Jack: Você está prestes a descobrir...


E nesse momento, até o ventilador do meu quarto silenciou. Deixei os dois se encararem em silêncio, por um longo momento. Sentia alí uma responsabilidade enorme. Eu estava dando continuidade a um clássico, uma história que fez parte da minha infância e que agora estava prestes a ganhar um novo capítulo.


Como um diretor que tem a oportunidade de filmar a sequencia de um filme consagrado depois de mais de dez anos, eu estava em pânico. Quem daria o primeiro passo? Quem deveria acertar o primeiro soco? Os fãs dessa história (no caso, eu) não podiam sair decepcionados dessa aventura. Eu teria que caprichar.


E iniciando com a boca uma trilha sonora bem ao estilo "Mortal Kombat", a pancadaria começou.


Socos, voadoras e movimentos bem improváveis voltaram a povoar meu raciocínio, e eu era de novo uma criança. Movimentos em câmera lenta agora fazem parte das cenas de ação, e os golpes das WWE influenciam as sequencias coreografadas.


Quando de repente o Mascarado invade a cena, atacando tanto Jack quanto seu proprio Chefe, o choque é geral. O cara se voltou contra todos!! Meu Deus, como eu nunca tinha feito isso? Aplausos orgulhosos da minha platéia imaginária.

E quando Negão aparece só pra morrer rapidinho, o público vem abaixo, rindo e dando vivas, satisfeitos com a boa e velha fórmula que foi mantida nessa versão moderna.


E assim foi. Durante mais de 40 minutos, eu esqueci de tudo. Tudo que existia na minha cabeça eram movimentos, barulhos de golpes e urros de dor, efeitos sonoros de todos os tipos, angulos diferentes pra "filmar" um mesmo golpe. Voltei a bolar mortes geniais, golpes inimagináveis, reviravoltas bem sacadas e sequencias de ação de fazer inveja a qualquer John Woo.




E lá pras duas e meia da manhã, no chão do meu quarto ainda estava eu, as mãos imundas de poeira, as costas doendo da posição tosca em que eu estava e o sorriso mais puro do mundo no rosto. Missão cumprida. A batalha foi épica. Jack novamente venceu, mas Caolho, pra variar, escapou com vida. Novamente. Como sempre costumava ser.


Tomei um banho, ainda relembrando os momentos mais altos do espetáculo. Mandei depois uma mensagem pra uma amiga, contando o quanto eu estava feliz por ter brincado com meus amigos de infância. Ela deve ter achado, dessa vez mais do que nunca, que eu sou louco. Deitei na minha rede, cansado, mas ainda sorrindo por ter conseguido com sucesso voltar no tempo e trazer de volta os enredos de minha infância. 


Pois eu, diferente de muito marmanjo metido a adultão por aí, consigo ser criança quando eu preciso. E não me envergonho disso. nem um pouco. Eu ainda curto meus brinquedos. Eu ainda assisto desenho animado com toda a atenção do mundo. Eu ainda curto revista em quadrinhos e dou risada de verdade com a turma da Mônica. Eu ainda dirijo escutando Xuxa, Balão Mágico e Trem da Alegria no carro.


Tudo isso porque eu sei dar valor à melhor época de minha vida. Tudo isso porque eu sei abrir minha mente e voltar no tempo, pra reviver aqueles momentos onde eu era realmente feliz. Tudo isso por que eu sei que enquanto a gente conseguir manter a criança dentro de nós viva, a nossa vida fica bem mais fácil de ser vivida.


E eu continuo assim, para quem sabe daqui a alguns anos, eu possa novamente abrir essa caixinha do passado e ter a honra de reger, com muito orgulho e entusiasmo, mais uma batalha.  Um último encontro.


Um ultimo confronto.


Ou só mais um capítulo na história sem fim da minha infância...


Bjs AmigoEstouAqui...

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